Aos 18 anos, Domingos Geraldo Sica venceu o concurso cultural lançado pela Câmara Municipal e deu a Mogi um símbolo carregado de história, memória e significados. Hoje, aos 80 e tantos anos, ele relembra como nasceu a bandeira e compartilha detalhes de sua vida marcada pela ciência, pela dedicação à cidade e pelo reconhecimento do Exército Brasileiro.

Entre memórias de juventude e décadas de dedicação à medicina, Dr. Geraldo Sica nos recebeu com serenidade e olhar atento, carregando em si a experiência de um profissional premiado e a lembrança viva de quem criou a bandeira de Mogi das Cruzes. Ao falar sobre a história que ajudou a escrever, suas palavras transmitem não só conhecimento, mas carinho pela cidade, pelas pessoas e pelos símbolos que conectam gerações. É nesse encontro entre história, ciência e afeto que a entrevista se iniciou, convidando o leitor a conhecer a história para manter a memória e a cultura vivas!
Como tudo começou
Na década de 1950, Mogi das Cruzes ainda não tinha uma bandeira, tinha somente seu brasão. A Câmara Municipal formou uma comissão de vereadores com Afrodízio Witzel, Gabriel Rodrigues, Nesclar Faria Guimarães, Miled Cury Andery e Fernando Guena, presidida por Jacob Cardoso Lopes. Foi lançado um concurso cultural entre estudantes do Instituto de Educação Dr. Washington Luís, dos cursos Científico e Clássico, áreas de interesse do que se tornou hoje o Segundo Grau. Sob a orientação do professor doutor em História, Paulo Lopes da Silva, especialista em heráldica – estudo de brasões e bandeiras, cerca de 150 jovens participaram do concurso.
Foi então que o desenho de Domingos Geraldo Sica, estudante do curso Científico, conquistou os jurados. “Confeccionada por Neide Cunha Cardoso e Dolores Cordovilla, com a participação de Cremilda Cunha Cardoso, mãe de Neide, a bandeira foi apresentada oficialmente no aniversário da cidade em 1957, durante o desfile em carro aberto pelas ruas centrais. Carregava a bandeira no estilo porta-bandeira, abrindo as alas de um desfile, só que estávamos sendo levados por um jipe, eu e meus colegas de curso.”, conta em detalhes o vencedor do concurso, endossado pelo documento da Câmara Municipal de Mogi das Cruzes, datado de 24 de novembro de 1960, em que foram apresentadas as justificativas para conferir o título de Honra ao Mérito ao estudante.
Elementos e simbolismo
A bandeira reúne cores e símbolos que dialogam com São Paulo, com a história nacional e com a memória mogiana:
– Preto, branco e vermelho: as cores da bandeira do Estado de São Paulo, com o branco representando os ideais pacifistas e progressistas do município.
– Fundo azul em triângulo: referência à bandeira nacional.
– O brasão de Mogi: o brasão traz a figura dos bandeirantes e a inscrição em latim que marca a presença portuguesa – “bandeirantes gens mea”.
– Estrelas simbolizam três momentos: a passagem de D. Pedro I por Mogi antes da Independência do Brasil; a Revolução Constitucionalista de 1932, com 974 mogianos participantes e quatro mortos em combate; e o protagonismo da cidade nas rotas dos bandeirantes, incluindo Fernão Dias e Gaspar Vaz.
– A cobra fumando: homenagem à participação dos 404 mogianos integrantes da Força Expedicionária Brasileira – FEB que estiveram na Segunda Guerra Mundial. O símbolo nasceu da expressão “só quando a cobra fumar”, dita em tom de ironia, mas transformada em orgulho nacional após a vitória em Monte Castelo – “a cobra fumou”.
Um legado para gerações
Além de ser um símbolo oficial e um patrimônio cultural, a bandeira de Mogi das Cruzes carrega as histórias de estudantes, professores, combatentes e cidadãos. Ao revisitar essa memória, Dr. Geraldo Sica fala de uma cidade que soube se reconhecer em seus símbolos. “Foi uma honra participar desse momento histórico. A bandeira é de todos os mogianos, um elo entre passado, presente e futuro”, conclui. Como material didático de apoio à entrevista, entre fotos e documentos, uma apresentação no formato storytelling, técnica que trouxe de seus muitos anos dedicados à área acadêmica, em que descreve uma linha do tempo ilustrada – e assim finalizamos a entrevista gentilmente cedida à Revista Opinião, como parte das comemorações do aniversário de 465 anos da “nossa” Mogi!
VOCÊ SABIA?
O desenho original da cobra fumando foi feito pelo sargento Ewaldo Meyer, e, em 1945, Walt Disney criou uma versão para homenagear os pracinhas que foram à Itália combater ao lado do Aliados.
Embora o primeiro brasão tenha sido criado em 1929 na gestão do prefeito Carlos Alberto Lopes, em 1931, durante o regime militar, o prefeito nomeado por Getúlio Vargas, Cel. Eduardo Lejeune, encomendou um novo brasão, desenhado por J. Wash Rodrigues, inspirado na obra de Jean Baptiste Debret, sob a direção do historiador Affonso de Taunay.
Em 2015, atendendo às regras da heráldica, o brasão de Mogi passou por uma atualização realizada pelo designer gráfico mogiano, Pedro Antonio Caraça Junior – foram acrescidas quatro torres, somando oito, conjunto que caracteriza o local como sendo um município.
O príncipe regente, D. Pedro passou por Mogi acompanhado de sua comitiva, com destino à São Paulo, no dia 23 de agosto de 1822, semanas antes da Independência. Nesta data assinou dois decretos na Casa da Câmara e Cadeia, no endereço em que hoje está instalado o Grupo Escolar Coronel Almeida. Um dos decretos exonerava o marechal-de-campo José Arouche de Toledo Rondon e o outro, nomeava Cândido Xavier de Almeida e Sousa para o cargo de governador das armas, o que simbolicamente, tornou Mogi a capital da colônia por um dia.
Sobre a passagem de D. Pedro I por Mogi, ele teria se hospedado nas dependências da igreja do Rosário ou do Carmo. Há quem diga que pernoitou no coreto do jardim em frente à igreja de São Benedito.
Por Maria Teresa Arbulu, publicitária e redatora




