Queridas famílias,
Escrevo esta carta não apenas como diretor, mas como educador. E, talvez, mais ainda: como alguém que acredita de verdade na educação como forma de transformação. Escrevo com o coração aberto, representando todos nós que compomos a escola: professores, coordenadores, monitores, auxiliares, cada pessoa que entra todos os dias com a intenção genuína de formar seres humanos melhores.
Este não é um texto protocolar. É uma tentativa de conversa. Daquelas que a gente evita, adia, engasga. Mas que, no fundo, sabemos que são urgentes. Nós vemos seus filhos. E quando digo “vemos”, não é só na presença física dentro da sala. Vemos seus gestos, suas palavras, suas ausências, seus silêncios. Vemos quando se esforçam. Vemos quando desistem. Vemos quando desafiam. Vemos quando agem com coragem, e também quando se perdem em atitudes que magoam os outros.
E nem sempre é fácil falar sobre isso. A escola, que deveria ser um espaço de formação e diálogo, muitas vezes se cala. Vai se encolhendo, com medo de parecer dura demais, crítica demais, exigente demais. Medo de que a verdade não caiba no mundo idealizado pelas famílias. E assim, silencia. Deixa de educar. Deixa de ser escola.
Apontamos o aluno que conversa a aula toda, e ouvimos que ele é só “comunicativo”. Aquele que debocha do professor, e escutamos que o professor “não tem pulso”. O que não entrega as atividades, e a culpa recai sobre a escola que “não motiva”. Aquele que intimida os colegas, e nos dizem que é “só jeito dele”. Há ainda a família que está sempre ocupada demais para responder um recado, participar de uma reunião, acompanhar a rotina escolar, mas que exige respostas imediatas quando algo sai do esperado. Apontamos os sinais de desatenção, de desrespeito, de falta de responsabilidade – e somos acusados de exagero. Pedimos limites – e ouvimos que estamos sendo duros demais. Sugerimos acompanhamento – e somos acusados de “rotular”.
Solicitamos um livro com temas delicados, mas adequados à idade, e somos questionados por tocar em assuntos que muitos preferem fingir que não existem – enquanto os mesmos alunos consomem conteúdos muito mais pesados, sozinhos, trancados no quarto, navegando em um mundo digital onde não há filtros, nem orientação, nem diálogo.
Nem sempre é fácil para as famílias perceberem quem seus filhos realmente são dentro do ambiente escolar – com seus talentos, mas também com suas inseguranças, desafios e contradições. E, muitas vezes, a escola, receosa de ser mal interpretada ou de provocar desconforto, hesita em mostrar o que vê. Assim, seguimos em caminhos paralelos, ambos tentando proteger e ajudar o mesmo jovem, mas sem conseguirmos nos encontrar de verdade. Quando deixamos de nos ouvir, deixamos também de nos reconhecer como parceiros.
Não podemos idealizar uma parceria que só existe no discurso. Relação entre família e escola precisa ser construída na prática, no cotidiano, com confiança mútua e escuta verdadeira. Às vezes, dizemos que confiamos na escola, mas duvidamos das intenções do educador diante do primeiro desconforto. Às vezes, valorizamos a educação, mas temos dificuldade de aceitar quando ela mostra aquilo que não queríamos ver. Educar junto significa estar disposto a dialogar com sinceridade – inclusive sobre o que nos desafia – e perceber que ouvir sobre nossos filhos não é julgamento, mas cuidado. Quando há respeito e abertura de ambos os lados, as diferenças viram pontes, e não barreiras. E é exatamente isso que buscamos: pontes sinceras entre escola e família, unidas por um objetivo maior – o crescimento dos nossos alunos, como estudantes e como pessoas.
Educar é mais do que ensinar conteúdos. É formar caráter, incentivar escolhas conscientes, preparar para a vida real. E a vida real exige limites, escuta, responsabilidade, empatia, frustração. Exige coragem. Estamos aqui para isso. Ainda acreditamos. Ainda queremos conversar. E mais do que isso: queremos construir uma escola viva, que não tenha medo de dizer, e uma família presente, que não tenha medo de escutar.Porque no centro de tudo isso há alguém que amamos em comum: seu filho.
Vamos conversar? De verdade. Sem máscaras. Sem muros. Com coragem. Com verdade e esperança.