Há alguns meses, o noticiário voltou a falar sobre guerra – de novo. Países disputando territórios, poder, crenças. Mísseis, drones, sirenes. E, em meio ao caos, uma imagem silenciosa se repete: escolas destruídas, quadros queimados, mochilas abandonadas. Porque antes de uma geração ser perdida nos campos de batalha, ela é perdida nas carteiras que ficaram vazias. É curioso: enquanto uns lutam por fronteiras geográficas, outros – nós – travamos batalhas invisíveis dentro de escolas que ainda tentam ensinar em meio à apatia, à pressa e à distração. Aqui, não caem bombas, mas caem propósitos. E talvez seja isso o que mais assusta.
A guerra, quando não é literal, é simbólica. Está na luta diária entre o conhecimento e a ignorância, entre o diálogo e o ódio, entre o respeito e a intolerância. Está no descaso pela leitura, na desinformação viralizada, na incapacidade de ouvir o outro. E é por isso que a educação, mesmo longe das zonas de conflito, continua em trincheiras.
Enquanto crianças em Gaza, Ucrânia ou Sudão correm para abrigos, há crianças em qualquer cidade do Brasil correndo de si mesmas – fugindo do esforço, da frustração, da responsabilidade. Não há bombas, mas há um bombardeio constante de estímulos, de expectativas, de comparações.
A diferença é que lá a guerra é visível; aqui, é silenciosa. E talvez por isso, mais perigosa.
A educação deveria ser o terreno neutro da humanidade – o único espaço onde o medo e a intolerância perdem o fôlego diante da curiosidade e da razão. É na escola que a humanidade deveria aprender, todos os dias, a não repetir suas falhas: a violência travestida de poder, a ignorância disfarçada de opinião, a indiferença que mata lentamente.
Mas o que temos feito desse espaço? Temos ensinado o suficiente sobre empatia, ética e humanidade – ou apenas sobre fórmulas, algoritmos e decorebas? Quantas vezes uma aula termina e o aluno sai sem ter aprendido nada sobre si mesmo, sobre o outro, sobre o sentido de estar ali?
A escola, que deveria formar cidadãos conscientes, muitas vezes se contenta em treinar competidores ansiosos. Corremos atrás de resultados, de rankings, de notas, como se o mundo ainda fosse previsível e seguro, como se bastasse saber “o que cairá na prova” para sobreviver ao que está caindo lá fora.
– Estamos educando para vencer – mas esquecendo de ensinar a conviver.
– Educando para o sucesso – mas não para o sentido.
– Preparando para o mercado – mas não para a vida.
E o resultado é um paradoxo doloroso: gerações inteiras que sabem cada vez mais sobre o mundo, mas cada vez menos sobre as pessoas. Porque não há paz possível onde não há empatia, e não há empatia possível onde não há educação que olhe para o humano antes do conteúdo.
Enquanto o mundo regride em diálogo e avança em ódio, a escola precisa reafirmar seu papel mais político – não partidário, mas humano. Porque educar é, antes de tudo, um ato de coragem. Coragem de resistir à indiferença, ao egoísmo, ao consumo, à pressa. Coragem de resistir à ideia de que nada mais vale a pena.
As guerras de hoje talvez não sejam vencidas com tanques, mas com ideias. E a sala de aula, mais do que nunca, é o campo onde se decide o futuro da paz.



